O INTENSO FENÔMENO CLIMATOLÓGICO DENOMINADO GLACIAÇÃO

Glaciação é um fenômeno climatológico que ocorreu diversas vezes na história do planeta Terra. É um período de frio intenso que faz a temperatura média da Terra baixar, provocando o aumento das geleiras e diminuição do nível do mar. Entretanto, esse fenômeno climatológico é pouco conhecido pela ciência, pelo fato de cientificamente nunca termos vivido seu auge. Discute-se muito porque, ou o que faz a temperatura média do planeta cair a tal ponto de promover a glaciação.

É preciso dizer que a temperatura do planeta sempre oscilou ao longo da história, desde os primórdios da Terra quando a atividade solar era cerca de 25% menor que a atual e a composição atmosférica do planeta era diferente. De certa forma, a temperatura média do planeta Terra em geral foi de 8°C a 15°C graus. Atualmente a temperatura média é mais alta, mas não por questões antropogênicas, mas porque naturalmente o planeta sofre com ciclos de aquecimento e resfriamento global.

Esses fenômenos são cíclicos e o que discutiremos aqui pouco tem a ver com a hipótese de que o aquecimento global é causado pela atividade antrópica. O que sabemos é que assim como a glaciação, períodos de aquecimentos também são normais. O que parece provocar o resfriamento global, ou glaciação é um conjunto específico de circunstâncias, especialmente astronômicas.

A teoria mais coerente a respeito deste fenômeno foi apresentada em 1920 pelo matemático iugoslavo Milutin Milankovitch. Ele defendeu que o clima da Terra é determinado pelo volume de energia que ela recebe do sol. De fato, o sol é o principal fornecedor da energia consumida no planeta Terra sob a perspectiva ecológica e até mesmo humana. Tudo gira em torno da atividade solar, cerca de 99, 6% da energia que utilizamos é direta ou indiretamente vinda deste astro. Segundo Milankovitch, a incidência de radiação solar do nosso planeta gira em torno de três fatores astronômicos; a natureza irregular da orbita, a inclinação do eixo da Terra e as oscilações que ela sofre em torno deste.

A natureza irregular da órbita terrestre em torno do Sol permite que a cada período de cerca de 100 mil anos a órbita do planeta passe de um círculo quase perfeito para uma forma ligeiramente oval, ou elipse. À medida que a excentricidade aumenta, ou seja, a medida que ela se torna mais ovalada a órbita chega a um ponto em que o planeta esta mais perto ou mais distante do sol.  Periélio é o nome dado ao momento em que a distância entre a Terra e o Sol é menor. Isso causa menor insolação e temperaturas mais baixas.

O outro fator que influencia a temperatura média da Terra é a inclinação do eixo de rotação da Terra. O eixo de rotação da Terra não forma um ângulo perfeito de 90 graus com a linha do Equador, ele varia ente 21,8 e 24,4 graus a cada 40 mil anos. Com o máximo de inclinação a insolação e as temperaturas caem.

O ultimo fator esta relacionado ao modo pelo qual a Terra oscila em seu próprio eixo, como um pião. Em períodos de 21 mil anos esse fenômeno afeta a inclinação do planeta e leva a queda de temperatura média. Quando os três fatores se reforçam mutuamente, eles mergulham a Terra em uma glaciação.

Apesar de Milankovitch ter demonstrado que as glaciações do passado coincidem com períodos de insolação mínima, outros cientistas mostraram que somente os fatores astronômicos isolados não fazem baixar drasticamente as temperaturas.  Ao que parece esses fatores criam uma cadeia de eventos climáticos que estimula a próxima glaciação.

Modelagens matemáticas feitas em computador revelaram que a Terra poderia passar de seu atual período interglacial para a glaciação em si em apenas 60 mil anos. Isso quer dizer que a diminuição da temperatura media necessária para entra em uma glaciação no momento deveria ser em cerca de 6°C. Atualmente a temperatura média da Terra é de 15°C.

Ao que parece, somente parte dos eventos que potencialmente podem levar a Terra a uma glaciação foram descobertos. A lista de todos os fatores que estão relacionados a glaciação ainda é desconhecida em toda sua complexidade. A própria definição de quando a glaciação começa é incerta. De acordo com alguns especialistas se há alguma parte da superfície da Terra coberta por gelo, teoricamente já estaríamos vivendo em uma era glacial. Atualmente, cerca de 10% do planeta esta sob geleiras. No auge de uma glaciação essa proporção pode chegar a 30 ou 35%. Houve períodos em que a Terra foi totalmente congelada e períodos onde não havia grandes geleiras como as da Antártida. De fato, no período Cretáceo, entre 146 e 65 milhões de anos atrás a Antártica era dominada por florestas de coníferas e notofagáceas. A Terra era pelo menos 5 graus mais quente que a temperatura atual e até mesmo a concentração de carbono na atmosfera era maior. Os moluscos amonites eram comuns nos mares em torno da Antártica, bem como dinossauros, embora somente duas espécies antárticas tenham sido encontradas até agora (Criolofossauro e Antarctopelta). No último bilhão de anos, a Terra passou por cinco períodos glaciais. Alguns muito intensos denominados Terra Bola de Neve.

A Terra hoje esta em um período interglacial ou quase glacial. Se realmente estamos em um período glacial, esta é a sexta glaciação do último bilhão de ano. Assim, essa glaciação seria mais uma de tantas conhecidas dos últimos 2 milhões de anos. Teoricamente isso seria uma contradição se lembrarmos que há cerca de 10 mil anos uma era do gelo cessou e deu origem a um novo período geológico denominado Holoceno, na qual ainda vivemos.

Isso ocorre porque dentro de um período glacial extenso a temperatura não é sempre a mesma, mas ao que parece, para cada 100 mil anos de muito frio, temos cerca de 10 mil anos de temperaturas mais amena. Atualmente, estamos há 8 mil anos em um desses períodos menos gelados, portanto, teoricamente, entre 2 ou 4 mil anos a Terra deve ter sua temperatura média diminuída, entrando em um novo período de glaciação e consequentemente uma nova expansão da camada de gelo. Cientificamente se conhece bem a evolução da temperatura do planeta nos últimos 270 mil anos devido as investigações feitas no fundo do mar e na superfície terrestre. Durante os últimos 2 milhões de anos o clima variou muito, com alternância de fases glaciares e interglaciações que se refletiram acentuadamente na modelagem da superfície do planeta.

Conhecer esses fenômenos climatológicos é fundamental porque eles tem influência direta na evolução de nossas características biológicas e na evolução da vida. Os locais de maior latitude e altitude no planeta, bem como altas montanhas sofreram muito a ação do gelo e os terrenos adjacentes também, especialmente com as erosões do fluxo de água em consequência da existência e da alternância entre períodos de gelo e períodos de degelo.

Nas latitudes baixas, em vez de se verificar fenômenos ligados a glaciação é mais comum a alternância de períodos muito chuvosos com períodos de grande aridez. Nas latitudes mais baixas as oscilações climáticas não são tão expressivas de acordo com o registro paleoclimático. Esse período de 2 milhões de anos, denominado Quaternário, se divide em Pleistoceno e Holoceno. Esse é o período que melhor se compreende ao estudas a glaciação sob o ponto de vista geológico, paleobotânico, paleontológico, paleomagnetismo estudados também  em análises laboratoriais. O Pleistoceno é divido em 3 períodos bastante característicos no registro geológico: Pleistoceno inferior, médio e superior.

Cronologicamente o Pleistoceno inferior vai desde o início do Quaternário a 2 milhões de anos até a inversão da polaridade do campo magnético da Terra que ocorreu há cerca de 1 milhão e trezentos mil anos.  O Pleistoceno médio inicia-se a partir de então e vai até ao início da interglaciação denominada Riss-Würm datada de 120 mil anos. O Pleistoceno inferior compreende o último período interglacial e a glaciação de Würm, terminado com o fim da era do gelo a 11.800 anos. A partir de então começa o Holoceno.

Foram os grandes Alpes europeus que serviram para se estabelecer uma escala temporal para as diferentes glaciações, bem como a observação da mobilização de materiais terrestres superficiais deixados pela ação do degelo, seus efeitos na geologia global, nos seres vivos e nas espécies vegetais. Desde o início do século XX tem-se conhecimento de quatro glaciações; Gunz, Mindel, Riss, Würm. Posteriormente notou-se a ocorrência de um período anterior à glaciação de Gunz, denominado Donau e antes mesmo deste, sabe-se da ocorrência de outra glaciação, denominada Biber. Esta nomenclatura glacial foi baseada em estudos feitos no nos afluentes do rio Danúbio.

Mesmo dentro de cada período é possível detectar momentos de uma suavização da temperatura no decorrer da glaciação. Por exemplo, existem três desses estágios na glaciação Donau que se iniciou a 2 milhões de anos e apresentou períodos de suavização denominados Donau I, Donau II e Donau III. A glaciação Gunz que ocorreu entre 1.100 milhões de anos até 750 mil teve dois períodos de suavização, Gunz I e Gunz II. A glaciação Mindel também teve dois períodos (MindelI e Mindel II) e ocorreu entre 580 e 450 mil anos. A glaciação Riss teve três períodos (Riss I, Riss II, Riss III) entre 200 e 140 mil anos; a glaciação Würm teve quatro períodos de suavização (Würm I, Würm II, Würm III e Würm IV) e ocorreu entre 80 e 10 mil anos.

Dentro de cada estádio verifica-se a existência de várias fases denominadas de períodos interglaciares, entre Donau e Gunz, Gunz e Mindel, Mindel e Riss e também entre Riss e Würm.

Na Europa a glaciação começou nos pontos mais altos da Escandinávia até à Sibéria formando grandes camadas de gelo e no ápice de sua ocorrência se estendia pelo Mar do Norte até ao Sul das Ilhas Britânicas, Alemanha, Norte da Holanda, Polônia, Dinamarca e o Mar Báltico. Os Alpes ficaram cobertos por uma espessa camada de gelo que atingiu alturas de três mil metros e alcançou a extensão de trinta mil quilometros.

Infelizmente nem todos os registros foram preservados, por exemplo, na Península Ibérica só existem evidencias da glaciação Würm, a última que ocorreu e algumas evidencias da glaciação de Riss. Na Ásia, a glaciação atingiu também grandes extensões, desde no Norte dos Urais à Península do Tamir e o Himalaia. Todos atingidos pelas ultimas quatro glaciações.

Nas Américas as glaciações cobriram uma extensão de 12 milhões de quilometros quadrados. No Norte e no Sul dos Andes também se conheceram glaciações, bem como os montes da Nova Zelândia e da Austrália.

Nas baixas latitudes, onde o índice de pluviosidade aumentou durante a glaciação verifica-se a subida do nível das águas de lagos e rios. Isso aconteceu com o Mar Morto, no Quênia e na Abissínia onde se grandes lagos se formaram. No deserto do Sara e do Kalahari foram cobertos de vegetação.

Nesses períodos ocorreu a retração das águas do mar devido à acumulação da água sob a forma de gelo nas calotas polares. Este fenômeno provocou o aprofundamento do leito dos rios nos períodos em que as geleiras derretiam e provocavam o arrastamento de materiais formando plataformas nas margens dos rios. Os sedimentos foram sendo depositados ao longo da Era Quaternária no interior de grutas e de abrigos sob rochas, terraços fluviais e antigas praias constituem excelentes locais de investigação deste período.

Foi durante os períodos interglaciares que se assistiu a uma expansão das espécies vegetais e da melhoria de condições para a vida animal. De fato, como verificado pelos geólogos e pelo geógrafo Aziz Ab’saber a alternância de temperatura é responsável pelo desenvolvimento e evolução de ecossistemas inteiros. No Brasil, por exemplo, períodos de seca levam a vegetação a ter uma fitofisionomia típica de Cerrado com refúgios florestais. Em períodos úmidos as florestas tropicais emergem e elevam o nível de endemismo de espécies.

Além disso, o desenvolvimento de grandes massas de gelo e a variações da pluviosidade condicionam o fenômeno de erosão, transporte e sedimentação e diversos outros processos que modelam a superfície terrestre e que ocorrem em função dos períodos de glaciação. Assim, há necessariamente uma constante exigência de readaptação da fauna e da flora a novas condições climáticas impostas. A fauna pode permanecer no mesmo local onde a glaciação ocorre e implica, naturalmente, em um enorme esforço adaptativo, como verificado nos registros fósseis. As espécies que não tiveram essa capacidade adaptativa viram-se obrigadas a procurar regiões onde o clima era menos rigoroso ou simplesmente desapareceram por impossibilidade de adaptação ou de migração.

A análise de fósseis vegetais, através da palinologia revelou que a Europa durante a última glaciação caracterizava-se pela sua paisagem de tundra, habitadas por renas, mamutes e o rinoceronte-lanudo adaptados ao clima. Eles tiveram que migrar para o a Escandinávia ou então desapareceram por não se adaptarem às novas temperaturas do fim do Würm, como foi o caso das duas últimas espécies. Após a última glaciação o clima tornou-se mais ameno e aumentou o teor de umidade do ar. Entrava-se então no Holoceno que caracteriza-se também em duas fases nítidas. A primeira denominada Boreal caracterizou-se por uma vegetação tipicamente de coníferas. A segunda, chamada Atlântica, onde se verificou o avanço dos bosques de folha caduca, fazendo regredir a floresta de coníferas para o Norte.

No início dos anos 60, quando geólogos encontraram evidências de que, 700 milhões de anos atrás, as geleiras não estavam confinadas unicamente as regiões polares. Uma equipe liderada por Francis MacDonald, da Harvard University, publicou uma pesquisa confirmando que há 716 milhões de anos as geleiras se estendiam a até 10 graus do Equador  e que elas mantiveram essa extensão por pelo menos 5 milhões de anos.

Scritto da Rossetti

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Referências.

Períodos de glaciação da Terra

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