DNA IRREDUTIVELMENTE COMPLEXO OU A IGNORÂNCIA IRREDUTIVELMENTE COMPLEXA DE ENÉZIO?

Há algum tempo desmistifiquei uma falácia criada pelo criacionista defensor do designer inteligente Enézio de Almeida na qual ele dizia que diferença genética entre seres humanos e chimpanzés era de 17%.

A falácia se respaldava em um artigo na qual dizia que a diferença ocorria entre os genes que tinham funções no sistema nervoso central. Isso quer dizer que se olharmos comparativamente os genes que tem singular importância na atividade cerebral temos 17% de semelhança, o que era de se esperar dada a diferença clara entre o sistema nervoso central de chimpanzés e humanos. Especialmente no que diz respeito as redes genéticas e as redes neurais. Entretanto, há homologia entre os genes, o que torna a alegação de Enézio especulativa e tendenciosa ao afirmar que a comparação foi feita em todo o genoma.

Agora aqui, Enézio trás mais uma alegação falaciosa. A descrição de Enézio é sobre um artigo científico sem nenhum tipo de defesa da ideologia fundamentalista americanizada do Designer inteligente. O artigo aborda as propriedades do código do DNA como análogas a máquinas termodinâmicas de conversão de energia em informação. A argumentação de Enézio é respaldada não nas evidências ou analogias apresentadas no artigo, mas o artigo é usado como evidência de uma conclusão pré-concebida. Como bem sabemos, isso não é fazer ciência. Conclusões se tiram de evidências.

Vejamos o nome real do artigo e o seu abstract publicado na Springer Link do artigo feito pela Cellular and Molecular Life Sciences.

Veja aqui

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A primeira questão é; o artigo não menciona nada sobre Designer inteligente, portanto a conclusão é pré-concebida e sem qualquer tipo de argumentação plausível. De fato a argumentação de Enézio é muito infantil e zombeteira:

DNA irredutivelmente complexo? Mero acaso, fortuita necessidade ou 100% design inteligente???

O DNA é irredutivelmente complexo? Há mais de duas décadas quem vem afirmando a informação complexa especificada digitalizada do DNA? Quem? Quem mesmo? Ah, a turma da teoria do Design Inteligente. Mas eles não sabem o que é ciência e nem fazem ciência…

Pano rápido, e olho vivo, pois cavalo não desce escada, mas o pangaré de Darwin já devia ter virado cola epistemológica!!!

Nenhum tipo de contra-argumento pode ser dado a Enézio já que nada foi alegado, e mais, a argumentação de Enézio não pode ser retirada do artigo que obviamente não foi lido pelo autor. Portanto, afirmar não é confirmar. Afirma-se mais do que confirma-se ou que argumenta-se. O Criacionista Michelson Borges apenas replicou tal texto sem qualquer tipo de comentários pelos motivos óbvios, ele não tem competência científica ou crítica para entender ou citar algo relacionado a teoria de informação, origem e evolução do código genético descrita por Carl Woese e as descobertas dos últimos 20 anos. A bioquímica por trás do código genético e a falta de necessidade de ler artigos científicos faz com que alguns autores postulem opiniões fajutas, descontextualizadas e frouxas do ponto de vista cientifico e muitas vezes até mesmo filosóficas

Compreender regulação genética é um problema de importância fundamental para a biologia molecular, genética e biologia do desenvolvimento. Muitos biólogos evolucionistas já compreendem bem o padrão de expressão e supressão de expressão de alguns genes em muitos animais, em especial insetos. Compreendem hoje que genes podem codificar proteínas com estruturas distintas apenas pela forma com que são expressos. Por exemplo, o biólogo Sean B. Carroll mostrou que o gene Distal-less é responsável pela construção das fiandeiras, pernas e pulmões de aranhas, das estruturas branquiais e pernas em crustáceos, das pernas e asas de insetos como a Drosophila e nas borboletas além de determinar essas estruturas, também regula a forma e padrões de cores das asas de borboletas. Todas elas são características criadas a partir de um gene homólogo, cuja função é distinta graças a mecanismos interruptores de expressão gênica. Há mais de 10 genes homebox homólogos entre os artrópodes e todos eles mudam seu padrão de expressão graças a mecanismo bioquímicos.

De fato, como dito no abstract do artigo citado acima, estudos recentes têm deixado cada vez mais evidente que o sistema de regulação genética incorpora vários elementos e estão envolvidos em diversas características biológicas. Talvez o mais evidente seja os mecanismo epigenéticos, que também são mecanismo evolutivos, como já descrito e corroborado há anos pela biologia molecular. De fato, Enézio afirmou em um de seus textos que a epigenética era um calço para a biologia evolutiva. Ao reconhecer que estes fatores alteram a expressão gênica ele acabou confirmando um mecanismo evolutivo. Em “A evolução em quatro dimensões” de Eva Jablonka e Marion J. Lamb, elas destacam que a herança epigenética é uma condição prévia para a evolução da vida multicelular. Uma habilidade para que organismos possam produzir diferentes tipos de células é baseado nas memórias celulares e estes são baseados em herança epigenética. O imprinting genômico é um exemplo intrigante de herança epigenética.

Outro ponto é, o artigo sugere que o DNA atua de forma análoga a informação digital, codifica a informação contínua, ou analógica, igualmente importante que especifica a dinâmica estrutural e de configuração de um polímero. Em janeiro de 2013 uma equipe de Britânica usou o DNA para armazenar informações humanas, como o famoso discurso de Martin Luther King ”I have a Dream”.

O DNA atua salvaguardando informações sobre como construir um ser vivo. De fato, pode ser análogo a informação digital, mas análogo não é correspondente, não é igual. Analogia é uma inferência de significado e não de correspondência ou identidade.

A analogia fica evidente em um dos autores deste estudo realizado em janeiro. Nick Goldman, deixou claro que apesar de armazenar informações no DNA ele não corresponde a um sistema igual ao de informações gerais. Se de fato fosse análogo a um sistema, como tendenciosamente pressupõem Enézio, as informações artificiais inseridas no DNA seriam interpretadas bioquimicamente. Nick Goldman deixa claro que “O DNA que criamos não pode ser incorporado acidentalmente a um genoma, ele usa um código completamente diferente daquele usado em células de organismos vivos…..E se esse DNA fosse parar dentro de você, seria degradado e eliminado.” 

Se a analogia que Enézio pressupõem se respaldar no fato de que ambos os sinais são menos susceptíveis a interferência, e estão são intrinsecamente associado na organização, bem, as mutações estão ai pra mostrar que tal analogia é falha. As mutações estão ai, elas existem! Se é que esta é a analogia real do artigo. Portanto, antes de afirmar o que artigo diz, é fundamentar ler antes.

O artigo ainda deixa claro que a revisão tem como proposta enfatizar a necessidade crítica de integração holística da informação do DNA como um pré-requisito para a compreensão da complexidade organizacional do sistema de regulação genética. Sem qualquer tipo de relação com desígnio inteligente.

De fato, a ideia de que há exemplos de complexidade irredutível na natureza já foi descartada em 2005 no famoso julgamento Kitzmiller v. Dover Area School District, em que as alegações de Behe não foram demonstradas em prática. Em síntese, não há qualquer unidade biológica ou mecanismo biológico que seja irredutivelmente complexo, nem mesmo o DNA.

A outra questão é olhar ele comparativamente a um polímero. Isto porque o processo de polimerização, ou seja, o processo químico na qual monômeros são agrupados de tal forma a construir cadeias poliméricas, é um processo aleatório. Por exemplo, os Copolímeros estatísticos são criados aleatoriamente no processo de polimerização. Copolímeros de butadieno-estireno e butadieno-acrilonitrila tem grande importância comercial, devido a sua aplicação na produção de pneus, em artefatos em que é necessária boa resistência a solventes orgânicos e a óleos. A aleatoriedade esta presente em processos químicos dos mais diversos.

Olhando por este prisma, poderia pressupor que a complexidade do DNA pode surgir por mero acaso, estabelecida como a conhecemos segundo a alegação de Enézio em relação ao seu comentário “DNA irredutivelmente complexo? Mero acaso, fortuita necessidade ou 100% design inteligente???

Mas o código genético se constitui de tal forma como conhecemos hoje por outros mecanismos, especialmente ligados a coevolução do código genético e vias biossintéticas de aminoácidos cuja versão atual pode explicar o fato de que alguns dos aminoácidos ligados bio-sinteticamente têm a mesma base na primeira posição do código. A teoria estereoquímica explica a associação entre a natureza da base que está na segunda posição e a do aminoácido. Em muitos casos, os mesmos aminoácidos são designados por códons que diferem entre si apenas na natureza da terceira base por que há semelhanças em certas propriedades físico-químicas atribuídas aos códons vizinhos com a mesma base na segunda posição.

De acordo com esta teoria, os padrões observados no código genético ocorrem devido à interação entre os aminoácidos e códons próprios, anticódons e códon. Essa interação ocorre por requisitos polares que não é mais do que o coeficiente de partição de aminoácidos no sistema de água-piridina. A teoria da otimização do código genético, ou de minimização de erros mostra que existe uma espécie de filtro de erros que ocorrem nos processos básicos de replicação, transcrição e tradução. Quando isso afeta a função básica de reconhecimento do significado estabelecido desses códons pode custar a sobrevivência do organismo.

Para fazer outra desambiguação, vale notar que o artigo original trata o funcionamento do DNA como um sistema análogo a uma maquina termodinâmica. Antes que alguém use o termo termodinâmica erroneamente, vale lembrar que a termodinâmica trata da “aproveitabilidade” de energia de um sistema e não tem relação alguma com complexidade biológica. Aumento de entropia (ou desordem) não é antagônico a evolução da complexidade de sistemas biológicos porque não tem relação alguma.

O conceito de entropia genética como alguns vem defendendo certas cosmovisões, não é um conceito biológico legítimo, ou seja, não é aceito cientificamente. Este conceito foi criado pelo criacionista John Stanford e não é aceito por universidades como um conceito coerente biologicamente falando.  Ao contrario do que diz Stanford, o termo entropia é unanime entre diferentes campos do conhecimento científico, ele se refere a uma grandeza termodinâmica. Sua extensão para aspectos genéticos é falaciosa e descontextualizada.

Em suas alegações, Stanford defendeu o conceito de “devolução” ou “involução”. Segundo suas modelagens, ele concluiu que o genoma está se deteriorando e, portanto, não poderiam ter evoluído na forma especificada pela síntese evolutiva moderna. Para Stanford, devido a acumulação de mutações prejudicais  ser maior que as neutras ou vantajosas cada indivíduo carrega consigo as suas próprias mutações bem como aquelas adquiridas dos ancestrais. Desta forma, segundo o autor o grau de desordem do genoma tende a aumentar e condenar toda espécie a extinção. Segundo o autor, cada geração carrega consigo cerca de 100 mutações novas e, portanto, se a evolução ocorre a milhares ou milhões de anos a tendência é que a espécie entre em extinção. Entropia genética é uma grande falácia, pois descaracteriza o fato de que se uma mutação que surge é deletéria geralmente vai custar a vida do individuo portador. Se ela causar a morte do individuo antes do início da idade reprodutiva esses genes jamais passaram para a geração seguinte.

Ora, se seguirmos a lógica insensata de Standford, veremos que o genoma vem se degradando, então não poderia ser irredutivelmente complexo, afinal, a degradação de qualquer uma das partes do sistema o faria parar de funcionar. Mas a alegação de Standford não é cientificamente considerável, tão pouco a defesa inteligentista de Enézio.

A única afirmação correta que Enézio parece ter passado em sua enfadonha e infantil analise teleológica é sobre os defensores do designer inteligentes na qual cita que “eles não sabem o que é ciência e nem fazem ciência…” De fato, Enézio é um desses defensores do designer, pois o que foi feito acima com certeza não foi ciência, mas sim interpolação meramente especulativa!!!

Scritto da Rossetti

Palavras Chave: Rossetti, NetNature, Enézio, Designer Inteligente, Complexidade Irredutível, Falácia,  Erros Criacionistas, Química, Informação, DNA, Biologia

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Referências

* Gupta RS. (2000). The natural evolutionary relationships among prokaryotesCrit. Rev. Microbiol. 26 (2): 111–31.
*  Nelson KE, Clayton RA, Gill SR, et al. (1999). Evidence for lateral gene transfer between Archaea and bacteria from genome sequence of Thermotoga maritimaNature 399 (6734): 323–9.
* Miguel Sautié Castellanos, Carlos M. Martínez Ortiz, Osmel Companioni Nápoles, José L Hernández Cáceres. Centro de Cibernética Aplicada a la Medicina, Instituto Superior de Ciencias Médicas de la Habana.

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