POR QUE OS CIENTISTAS ESTÃO PERDENDO A LUTA PARA COMUNICAR A CIÊNCIA AO PÚBLICO. (Comentado)

Os cientistas e comunicadores de ciência estão envolvidos em uma batalha constante contra a ignorância. Mas isso é uma abordagem condenada ao fracasso.

Fique quieto. É bom para você. Fotografia: Gareth Fuller / AP

Fique quieto. É melhor para você. Fotografia: Gareth Fuller / AP

Um vídeo fez uma abordagem sobre isto a alguns anos atrás, um vídeo auto-intitulado “skeptic” – discordando robustamente, digamos assim – de um proponente anti-vacina. O orador foi duramente aplaudido por todos por compartilhar o vídeo – ele com certeza colocou aquele idiota em seu lugar!

Os cientistas gostam de discutir. Escavar através das besteiras e chegar à verdade da questão é praticamente a descrição do trabalho. Portanto, não é realmente surpreendente cientistas e defensores da ciência freqüentemente batam naqueles que se envolvem em homeopatia, ou negam as mudanças climáticas antropogênica, ou que se opõem à vacinação ou alimentos geneticamente modificados.

Faz sentido. Você tem uma população que é – no seu conjunto – cientificamente não-alfabetizada, e que pretende convencê-los de que eles deveriam estar fazendo a e b (mas não c) para que eles / você / seus filhos possam ter uma vida melhor.

Brian Cox estava com um deles na semana passada, realizando um “confronto” com um negador das mudanças climáticas sobre no programa da ABC Q&A, um programa de discussão. Ele trouxe gráficos! Golpe de nocaute.

E, no entanto … algo me deixa frio. Isto é realmente comunicação científica? Esta informando, mudando mentes, conquistando pessoas para um futuro melhor, e mais brilhante?

Duvido que alguma forma.

Há um duas coisas aqui. Eu não acho que seja tão simples como as pessoas rejeitarem a ciência.

Primeiro, as pessoas não gostam de que seja dito o que elas tem de fazer. Isso é parte do que Michael Gove estava dizendo isto quando ele afirmou que as pessoas eram especialistas. Contamos com médicos e enfermeiros para nos fazer melhor, e em planejadores financeiros para nos ajudar a investir. Esperamos que os cientistas pesquisem novas curas para a doença, ou simplesmente para descobrir como as coisas funcionam. Esperamos que o governo tente fazer o melhor para a maioria das pessoas na maioria das vezes, e dos meteorologistas pelo menos que nos digam que hoje será igual amanhã.

Mas quando estes especialistas dizem-nos como viver nossas vidas – ou, pior ainda, o que pensar – algo se rebela. Especialmente quando há até mesmo o mero cheiro de controvérsia ou incerteza. De volta a sua caixa, dizemos, e ficamos com o que você é bom.

Vimos isso no recente referendo, vimos quando Dame Sally Davies disse que vinho faz pensar de câncer de mama, e vimos de volta no final de 1990, quando o governo da época disse às pessoas – que honestamente, realmente queria fazer o melhor para seus filhos – deveriam calar a boca, parar de fazer perguntas e tomar a maldita vacina da tríplice.

O que nos leva à segunda coisa.

No geral, eu não acho que as pessoas que se opõem às vacinas ou OGM estão em um anti-ciência cardíaca. Alguns são, com certeza, perigosos. Mas a maioria das pessoas simplesmente querem saber se alguém está escutando, que alguém está levando suas preocupações a sério; que alguém se preocupa com eles.

É mais sobre quem somos e nossos relacionamentos do que sobre o que é certo ou verdadeiro.

É por isso que, quando você traz dados para um programa de TV, você corre o risco de parecer arrogante e preconceituoso. Mesmo – especialmente – se você estiver realmente certo.

As pessoas querem se sentir queridas e amadas. Que existe alguém que vai ouvi-las. Para sentir-se parte de uma família.

A física Sabine Hossenfelder sabe disto. Entre os contratos uma vez, ela montou um serviço de “conversa com um físico”. Cinquenta dólares você fica 20 minutos com um físico quântico … Quem vai ouvir qualquer ideia maluca que você tenha, e ajudá-lo a entender um pouco mais sobre o mundo.

Quantos comunicadores de ciência sabem que vai levar algum tempo para ouvir seu público? Que estão dispostos a sair de sua pequena bolha acolhedora e fazer um esforço para alcançar as pessoas onde estão, onde estão confusos e ferir; onde eles precisam?

Atul Gawande diz que os cientistas devem afirmar “os verdadeiros fatos da boa ciência” e expor as “táticas de ciência ruins que estão sendo usadas para enganar as pessoas”. Mas isso é apenas parte da história, e está fechando a porta do celeiro tarde demais.

Porque os charlatães já reconheceram a necessidade, e tem construído as comunidades que as pessoas anseiam. Significativamente, Gawande refere-se à “comunidade científica”; e ele está absolutamente certo, não. A maioria da comunicação da ciência não é sobre persuadir as pessoas; é auto-afirmação para quem já está no interior. Olhe para nós, ele diz, não estamos inteligencia? Somos exclusivos, somos um grupo, somos uma família.

Isso não é comunicação. Não está mudando mentes e certamente não está ganhando corações e mentes.

É tribalismo.

Fonte: The Guardian

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Comentários internos

Um estudo feito nos EUA mostra metade dos americanos entende minimamente como funciona um laser funciona e cerca de 40% da população têm dificuldades para definir o que é uma reação química. Estudos sobre o analfabetismo científico são muito poucos no Brasil, mas nos EUA a Pew Research Center faz levantamentos periódicos sobre o tema.

Quando os dados destes estudos são classificados por áreas, mostram que os homens se saem melhor em temas ligados à física ou à matemática, enquanto na biologia não há muito diferença. Isto indica que há pouca participação feminina na participação e produção científica.

A Associação Americana para o Avanço da Ciência publicou uma um pesquisa de 2015 mostrando que entre seus membros somente 16% dos entrevistados considera o ensino de ciências americano adequado.

Estes dados, tanto nos EUA quanto no Brasil refletem um grave problema educacional, especialmente porque a ciência se torna cada vez mais presente em nosso cotidiano, e porque é muito importante para questões políticas. O conhecimento do assunto fica mais importante em relação a financiamentos da exploração espacial, mudanças climáticas, plantas geneticamente modificadas e tantos outros temas contemporâneos que dependem do conhecimento científico para serem discutidos em público, por quem vota e paga impostos.

Questões médicas também são de grande importância, como os limites éticos de pesquisas com células-tronco ou o uso abusivo de antibióticos. Estes temas discutidos sob uma compreensão limitada é reflexo da formação do cidadão que entende pouco ou quase nada sobre ciência.

Países com ensino científico ruim, como é o caso do Brasil, tendem a inovar pouco em produção científica, estabelecendo-se como meros compradores de tecnologia e com pouca produtividade (Folha, 2015).

Não é a toa que atualmente o país passa por um êxodo científico, onde os poucos grandes nomes da ciência do país optaram por fazer pesquisa fora do país, devido ao corte de financiamento de pesquisas e falta de incentivo na educação do país. Como pesqusias tem desdobramentos políticos, isto acaba interferindo na própria dinâmica do país impedindo a superação da crise que passamos.

Recentemente, a doutora em neurociência Suzana Herculano deixou o país para fazer ciência nos EUA e declarou que já teve de retirar dinheiro do próprio bolso para pagar por suas pesquisas. Ela destaca que toda sociedade científica brasileira está dominada por uma visão que desestimula inovação científica e desperdiça recursos, matando a esperança de uma geração de futuros pesquisadores que preferem hoje deixar o país em busca de oportunidades melhores lá fora (O Tempo, 2016).

O Brasil sofre com o analfabetismo científico. A avaliação é de educadores brasileiros que afirmam que nossas crianças não se interessam por ciência porque vivenciam um ensino fundamental deficiente e desinteressante, com professores mal preparados e condições inadequadas de infraestrutura. A conclusão foi obtida a partir do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) em 2012. A pesquisa revelou o mau desempenho dos alunos brasileiros em provas de matemática, leitura e ciências obtendo um resultado de 59º lugar em ciências em um ranking de 65 países (SBPC, 2013).

Uma educação melhor depende de várias transformações que levema escola a ser um espaço de produção cultural, com práticas que envolvam a participação ativa e propositiva dos estudantes. O professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), Luís Carlos de Menezes destaca que as transformações necessárias na educação científica não se fazem sem recursos materiais e humanos e dependem de efetiva vontade política.

Em uma pesquisa realizada em 2010 pelo Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) sobre a percepção pública da Ciência e Tecnologia no Brasil mostrou que a população brasileira não conhece os seus próprios cientistas e muito menos, a ciência e tecnologia aqui produzidas (SBPC, 2013).

A ciência deve ser matéria diária nos vários veículos da mídia e deve ser de qualidade. Não pode ser aquela velha forma sensacionalista que encontramos sendo divulgada, e tão pouco as alegações faláciosas propostas por movimentos anti-ciência ou de pseudociência.

A educação científica pode ser perfeitamente iniciada na faixa etária de dois e três anos. Nessa idade as crianças são curiosas e, portanto extremamente motivadas para a iniciação científica (SBPC, 2013).

Tenho alunos de 6 ou 7 anos, que estão na primeira série do ensino fundamental I e que assistem programas como o “Manual do mundo” e que quase cotidianamente vem me perguntar se tenho Borax, ácido sulfurico, água oxignada, provetas no laboratório. Para um aluno de primeira série conhecer tantos nomes difíceis, técnicos há um grande estimulo familiar e individual do aluno em achar ciência interessante: seja pela espetacularização dos maravilhosos videos científicos do youtube, seja pela própria natureza curiosada criança.

Isto mostra que quando o educador provê uma demonstração de maneira prática, como uma atividade lúdica (como a que faço cotidianamente em minhas aulas) e que vai além do quadro negro, os jovens e crianças prestam mais atenção e passam por um encatamento do mundo. E claro, a beleza da ciência esta em desvendar os mistérios da matéria, do espaço, da vida (SBPC, 2013).

Outroponto que é possível tomar nesta matéria é de movimentos anti-ciência: que é o que a matéria trata, quando cita o movimento anti-vacina.

A onda anti-ciência

Antiscience ou anti-ciência é uma postura crítica em relação ao método científico, que é tomada por indivíduos ou organizações baseadas em descorsiderar o poder e a influência da ciência. É uma forma de oposição a ela, tentando caracterizar a ciência como resultado de uma atitude mental arrogante e fechada entre os cientistas. Geralmente promovem uma ideologia acima das evidências científicas, negando-as e/ou criando suas próprias segundo suas crenças. A anti-ciência tem sido usada para se referir principalmente a movimentos pós-modernos associados com a esquerda política ou movimentos fundamentalistas socialmente conservadores relacionados com a direita política. Entretanto, é importante destacar que o apoio a uma posição ideológica de uma pessoa não a torna automaticamente uma pessoa anti-científica e vice-versa. Por exemplo, muitos dos questionamentos que a pós-modernidade fez sobre a ciência auxiliaram seu avanço. Quando se discuti ciência, ela avança!

O movimento anti-ciência se manifesta de diversas formas distintas, mas sempre de forma explicita. Ele parte da ocultação de fatos observados, da negação de evidências (como as pessoas que rejeitam a existência do HIV ou a rejeição das formas de transmissão), de tentativas fajutas de definir as ideias científicas como teorias da conspiração (como é o caso do aquecimento global). Há também tentativas de substituir a ciência respaldada a partir de evidências por pseudociência (métodos e afirmações com aparência científica, mas que partem de premissas falsas e/ou que não usam métodos rigorosos de pesquisa).

Outra estratégia da anti-ciência é desacreditar resultados científicos defendendo que eles têm más consequências. Por exemplo, a ideia de que a teoria da relatividade justificaria o relativismo moral ou mesmo que a teoria da evolução de Charles Darwin torna válido o darwinismo social e a as ideias da eugenia ou de pressupostos nazistas.

E por fim, a anti-ciência usa argumentos falhos para “justificar” uma posição pessoal ou incorreta para uma teoria que pessoalmente nega. O exemplo mais claro disto vem da própria discordância a evolução, ou Petição de Oregon.

De fato, Oregon é uma ótima referência para começarmos a analisar a questão da anti-ciência. Em 2013 moradores de Portland em Oregon (EUA) tornaram a cidade um exemplo de anti-ciência. Em Portland os moradores impediram a acreção de flúor na água, a partir de uma campanha comandada por teorias de conspiração e ganharam a direito de por em prática um projeto de anti-fluoretação da água.

O flúor é um mineral encontrado na natureza em baixas concentrações e é adicionado nas redes de abastecimento de água potável porque torna o esmalte do dente mais resistente e ajuda a evitar as cáries.  É uma forma segura e barata de assegurar a saúde de todos, ricos e pobres. Até hoje em Portland (e em muitos lugares do mundo) há militantes da anti-fluoretação alegando que há uma forma de controle populacional, que causa câncer ou que o consenso científico não respalda a prevenção que o flúor pode dar (National Geograhic, 2015).

Foto retirada do grupo americano Fluoride Alert em sua campanha contra a fluoretação da água

Foto retirada do grupo americano Fluoride Alert em sua campanha contra a fluoretação da água

O mundo passa hoje por uma onda anti-ciência embora  esteja afundado em uma sociedade completamente científica.  Ainda hoje existem militantes que são contra a segurança proposta pelo flúor, gente que faz campanha contra vacinação e os que negam a realidade das mudanças climáticas e tantos outros avanços da ciência. Eles se organizam em grupos anti-científicos e muitas vezes agem de forma extremamente virulenta.

Geralmente eles criam uma fonte de informação própria, interpretam dados da forma que mais lhes é convincente de tal forma a sustentar suas convicções e contestam de forma violenta pesquisas e consenso de especialistas de grandes universidades.  A contestação da ciência se tornou um elemento viral na cultura popular  Especialmente na internet onde se tornou um grupo organizado sem qualquer tipo de respaldo acadêmico que engloba desde opositores da teoria da evolução, terra-planistas até e os que negam que homem pisou na lua (National Geograhic, 2015). De fato, a maioria destes grupos só encontra peso na internet, porque em ambiente acadêmico não correspondem a grandes porcentagens.

A ciência e a tecnologia nunca estiveram tão presentes na nossa vida e ainda assim há pessoas que negam conhecimento básico desse assunto. Somos expostos a alimentos e produtos provenientes de organismos geneticamente modificados que não há evidências de que sejam danosos à saúde, assim como não há motivos para acreditar que genes introduzidos em laboratórios sejam mais perigosos do que a modificação deles feitos por métodos tradicionais, ou seja, a partir de cruzamento de espécies e seleção artificial (National Geograhic, 2015).

Para alguns o simples fato de transferir genes de uma espécie a outra é uma abominação. Nesse mundo temos de decidir no que vamos acreditar e partir disto definirmos como vamos agir. É pra isso que serve a ciência!

Ela não é um conjunto de fatos, mas sim um método para decidir se o quê aceitamos como verdade está ou não de acordo com as leis da natureza. Evidentemente este método não é natural para algumas pessoas, e outras tentam deturpa-lo para justificar crenças pessoais: como os opositores da teoria da evolução, seguidores do criacionismo (digo isto por experiência própria aqui no NetNature).

O método científico nos leva a verdades pouco evidentes e que muitas vezes são de difícil aceitação, como é o caso da teoria da evolução para os criacionistas. No início do século 17 ao sustentar que a terra girava em torno do sol e de seu próprio eixo, Galileu fez com que as pessoas re-pensassem sobre a doutrina da Igreja Católica  e acreditar em algo que não se encaixava no senso-comum.  Afinal, a aparência é que o sol gira em torno da Terra, além de não ser possível sentir a terra girando em seu próprio eixo. Galileu pagou caro por isso que quase morreu, a mesma coisa foi com Darwin. Para muitas pessoas é inconcebível e até o insulto afirmar científicamente que o homem é um primata. Verdades inconvenientes como a semelhança genética entre nós e outros primatas (como chimpanzé) são vistas como absurdos, em vez de ser vista como uma forma de reaproximação de nossa propria natureza.

Um estudo realizado por Andrew Shtulman revelou que até estudantes com formação avançada hesitam em afirmar ou negar que os seres humanos descendem de outros animais ou que a terra gira em torno do sol (National Geograhic, 2015).

Outra concepção negada é a do século 19 de que o dióxido de carbono (CO2) é um gás invisível que todos nós exalamos o tempo todo. Este gás representa 0.1% da atmosfera e pode estar afetando o clima do planeta. A pesquisa de Shtulman revela que  a medida que recebemos uma formação científica reprimimos convicções internas, mas jamais nos desfazemos delas por completo. As pessoas fazem isso recorrendo a experiências e narrativas de casos pessoais em vez de estatísticas impessoais (National Geograhic, 2015).

Para chegarmos a uma convicccão de que há um vínculo entre acontecimentos, ou seja, de relação causa e efeito, devemos pensar científicamente. Por exemplo, para estabelecer que há um vínculo causal entre a incidência de câncer e uma empresa que trabalha com produtos químicos é preciso analisar científicamente e estatisticamente dados que mostrem que ocorre mais casos de câncer em um determinado local do que ocorreriam aleatoriamente; indícios de que as vítimas tiveram contato com substâncias químicas advindas do agente emissor; e claro, vestígios de que tais substâncias podem, de fato, causar câncer.

Um exemplo em que tudo isto consolidou-se ocorreu no famoso caso de Erin Brockovich, na qual a ativista ambiental encontrou evidências de que as águas subterrâneas em Hinkley  (California) estavam contaminadas com cromo-hexavalente embora a empresa Pacific Gas and Electric (PG&E) estivesse afirmando (falsamente) aos residentes que a empresa usava uma forma mais segura de cromo.

No caso de negadores da ciência, existe uma tendência ao “viés de confirmação”, ou seja, ver apenas os indícios que corroboram o que eles acreditam. O exemplo mais claro vem dos terraplanistas que colocam uma régua no chão e dizem “Esta vendo, a terra é plana” e ignorando (ou satanizando) as imagens da NASA. O mesmo ocorre com grupos anti-vacinas que aceitaram um falso estudo dizendo que vacinas causam autismo, ignorando o fato de que a porcentagem de crianças salvas chega a mais de 90%, que estudos posteriores refutaram tal tese, e que o próprio autor forjou o resultado.

os pais dos pré-escolares protestar vacinas contra a gripe

Pais de alunos pré-escolares protestando contra vacinas da gripe. Fonte: NBCNews

Devemos lembrar que são raras as vezes que cientistas proclamam certezas absolutas. Há uma visão consensual da comunidade científica a respeito das mudanças climáticas: a temperatura na superfície de nosso planeta aumentou cerca de 0,8°C nos últimos 130 anos devido as atividades humanas, especialmente queima de combustíveis fósseis. Muitas pessoas, especialmente nos EUA, negam estas constatações (que vem sendo discutidas aqui), tem dúvidas quanto a validade do consenso dos maiores especialistas do clima, e estão convencidas de que ambientalistas vem recorrendo a ameaça do aquecimento global para se contrapor ao livre-mercado e a sociedade industrial. Claro, há aqueles que negam as mudanças climáticas para minar com falsas dúvidas e falácias as afirmações científicas com o intuito de rejeitar não apenas a realidade do aquecimento global, mas a partir disto, outras teorias consolidadas com grande êxito pela ciência. Este é o caso dos criacionistas tentando descredenciar cientistas do clima para afetar a produção de conhecimento e ensino da evolução biológica.

Nos EUA, céticos em relação as mudanças climáticas alcançaram grandes objetivos, como frear medidas legislativas contra o aquecimento global. Interromperam medidas que envolviam emissões de gases do efeito estufa. O fato é que quando pessoas são ignorantes e partem de falsas premissas, mas tem poder político, quem paga é toda sociedade. Neste caso, a ignorância não só mostrou que o ceticismo ingênuo atingiu certos objetivos em relação as mudanças climáticas, mas não percebeu que emissões de gases não são só um problema ambiental no que diz respeito as mudanças climáticas, mas também um problema de saúde pública. Trocando em miúdos: voce pode ser ingênuo o suficiente para não aceitar mudanças climáticas, mas não pode negar o fato de que compostos provenientes da queima do carbono, como o CO, e tantos outros derivados são verdadeiros protagonistas de sérios problemas de saúde. Vide os trabalhos do professor Saldiva pela USP.

Neste sentido, os cientistas precisam ser mais politizados, serem mais incisivos, se manifestarem e posicionarem. O problema é que os céticos do clima acreditam que quando um cientista do clima se manifesta ele é regido por um viés político e/ou que sua manifestação é referente mais a um posicionamento ambientalista do que realmente dados científicos. Esta afirmação é falsa e fundamenta-se na mais profunda desonestidade intelectual porque os cientistas que se manifestam, o fazem a partir de dados publicados formalmente. Aqui mesmo no NetNature há um conjunto de textos escritos ou traduzidos cujas referências são artigos científicos publicados e que devem pautar as decisões a serem tomadas e direcionar políticas públicas em relação ao meio ambiente.

Afinal, o que importa é o modo na qual a gente chega nestas verdades e não aquilo que gostaríamos que fosse verdade. E mesmo essas verdades, elas são paradigmáticas, e podem ser substituídas quando novas pesquisas fizerem emergir novos paradigmas. Um exemplo: a pouco tempo atrás o mundo foi chocado com o famoso “buraco na camada de ozônio” e de acordo com novas pesquisas publicadas em 2016, sua extensão tem diminuído. A presença do buraco foi constatada em 1950 após a erupção do vulcão Caluco (Chile) expelir compostos que aumentaram o tamanho do buraco (que pode se formar por causas naturais ou antropogênicas).

Não há vergonha alguma em mudar de posição mediante novas evidências. Infelizmente, para os individualistas, a posição dentro de um grupo é mais importante que uma constatação racional, e a crença em uma verdade é mais importante do que verdade.

Pensamento científico é algo que deve ser ensinado, e muitas vezes isto não ocorre porque os estudantes acreditam que ciência se faz apenas com coleta de dados em vez de um método mais rigoroso. Assim, para se posicionar diante de certas questões o método científico é uma excelente ferramenta de pesquisa, e no caso das mudanças climáticas, ele tem sido bem útil em indicar o quanto estamos afetando o clima global.

A defesa de que vários cientistas, especialmente os maiores especialistas em certas áreas, sejam coniventes com um imenso embuste é obviamente patética, afinal, a ciência trabalha exatamente na forma de superar as afirmações dos colegas de profissão, de tal forma que se uma afirmação é errada ou mesmo falsa, a teoria concorrente tende a destroça-la.

Sendo assim, não faz sentido acreditar que cientistas cooperem entre si para criar uma farsa mundial quando na verdade o que se pretende fazer é o exato oposto, pô-las a prova e contesta-las.

Claro, no caso da problemática ambiental, empresas que usam ou produzem combustíveis fósseis tentaram minar o entedimento da população em geral sobre as conclusões consensuais a que chegou a comunidade científica sobre a questão climática e desta maneira criar céticos do clima que eventualmente conseguem arrebanhar pessoas a sua causa. Geralmente pessoas não tem o conhecimento sobre como a ciência se caracteriza pelo seu método. Por esta razão, a luta contra o analfabetismo científico se faz necessária. Para evitar que pessoas ignorantes sobre o conhecimento científico sejam recrutadas a propagação de anti-ciência e pseudociências. A ideia é que a ignorância seja trabalhada com a divulgação de como ciência atua, qual sua identidade, seus limites epistemológicos para posteriormente fazer a crítica a questão ambiental, evolucionária, fluoretação ou qualquer outro assunto de cunho científico… para que não fique preso a falsa ideia e a um sistema quase-religioso de negação da ciência defendendo que o consenso científico é conspiratório.

Outra falsa ideia é a de que a ciência somente avança a partir de descobertas impactantes promovidas por gênios ou “gurus”. Os avanços na ciência são dados por meio da acumulação constante de dados e observações. Foi isto que fez com que se chegasse a conclusão das mudanças climáticas ou na teoria da evolução.

Um estudo sobre o modo na qual as pessoas estabelecem no que acreditar, por quê o fazem, e como se afastam da ciência foi feito por Dan Kahan da Universidade de Yale. Ele pediu a 1.540 participantes uma amostra representativa de uma avaliação das ameaças das mudanças climáticas em uma escala de 0 a 10. Posteriormente comparou as respostas dadas com os conhecimentos científicos. Kahan constatou que os níveis mais altos de conhecimento estavam associados a opiniões mais incisivas (em ambas as extremidades dos espectros). Isto indica que a formação científica levou a polarização a respeito do clima e não a um consenso. Isto ocorre porque as pessoas tendem a usar conhecimento científico para reforçar crenças pré-concebidas, ou seja, suas cosmovisões (National Geograhic, 2015).

Kahan afirma que americanos dividem-se em geral, em dois grandes grupos; há aqueles que são “igualitários” ou “comunitários” que desconfiam do setor privado acreditando que eles sempre se atrelam a atividades danosas que requerem um controle estatal: e há um grupo que é “hierarquico” ou “individualista” e confiam no setor privado, preferem que não haja nenhuma interferência em suas atividades por parte do governo. Estes, tendem a rejeitar as mudanças climáticas, porque sabem que aceita-las vai exigir a instauração de métodos de controle, impostos e responsabilização ambiental.

Quando discutimos não só sobre o clima, mas sobre a evolução das espécies (e a evolução humana), na realidade estamos debatendo sobre quem somos, e a qual grupo pertencemos. Para uma pessoa individualista não é irracional rejeitar as conclusões dos climatologistas, pois a aceitação delas não mudaria o mundo, mas pessoalmente ficam apreensivos por que poderiam expulsa-lo do grupo social na qual ele pertence.

A ciência faz uso da razão, do logos, da racionalidade, mas as crenças são motivadas pela emoção e a motivação para presevarmo-nos unidos, para sermos aceitos por nossos pares. Para o individualista irracional, a rejeição as conclusões obvias não ocorrem só na ciência, mas podem ter desdobramentos e consequências sociológicas perigosas. A pouco tempo tive a experiência de ver um colega de profissão defender a ditadura militar da década de 60 no Brasil, e quando questionado por seu posicionamento (que era de base ideologógica exclusiva e não inclusiva), respondeu que preferia perder um amigo do que a sobriedade e a razão que pautava seu argumento.

Obviamente não houve uso da razão, mas um discurso ideológico motivado por emoção e uma postura de senso-comum individualista. Pode não ser explicito para muitas pessoas, mas o que o movimento anti-ciência (e da pseudociência) vai defender tem desdobramentos sociológicos importantes. Como não destacar, o clássico exemplo, da negação do aquecimento global para afetar a teoria da evolução exercida nos EUA por uma maioria com posicionamentos políticos ultra-conservadores.

As pessoas sentem a necessidade absoluta de fazer parte de algum grupo e isto é algo tão intenso que os valores e opiniões mais imediatos se sobrepõem as conclusões científicas, ou seja, a necessidade de sua formação ideológica ou valores pessoais se impõem sobre o uso da razão.

A internet torna mais fácil organizar grupos de céticos e negadores. Como disse certa vez o filosofo Umberto Eco, a internet deu voz a um grupo de imbecis. E também fornece acesso a afirmações de especialistas que são aceitas de forma seletiva única e exclusivamente para que sirvam de fomento a suas posições.

O exemplo mais claro que vem a mente são os textos criacionistas que resumem-se nesta prática. É comum encontrarmos textos criacionistas e (quando há) referências usadas citam artigos científicos de revistas como a Nature, Science, PLOS, PNAS… além de referências bíblicas, textos informais escritos por eles mesmos ou em sites religiosos. Ao consultarmos o discurso anti-evolução e as referências que os acompanham notamos que os artigos científicos estão descontextualizados, ou que o autor do texto criacionista tão pouco teve acesso, ou leu, o artigo original na integra. De fato, todas as vezes que observei as citações de artigos que os criacionistas descontextualizaram, estes eram assumidamente em defesa da teoria da evolução explicando mecanimos e processos de seleção natural.

A internet democratizou o acesso a informação, isto é bom! Mas criou um contexto em que passou a circular informações falsas que não tem respaldo científico e é apresentada como se tivesse. Isto vai desde o ciacionismo até suco detox.

Uma forma que temos de convencer os céticos sobre a validade dos argumentos científicos é fazer com que os cientistas se comuniquem melhor entre si. Uma maneira dos céticos passarem a aceitar a validação científica de uma tese é demonstrar que as pessoas que eles admiram também partilham dos valores fundamentais da ciência.

Muitas vezes tendemos a decidir no que acreditar não porque avaliamos com cuidado os indícios, mas porque sentimos afinidade com o grupo na qual pertencemos. Podemos pertencer ao mundo da ciência ou não. O fato de aceitar a teoria da evolução talvez não diga nada sobre o modo como penso, e apenas descreva algum elemento sobre mim. Ok, mas a evolução ocorreu (e ainda ocorre, porque é dinâmica), e sem esta tese a biologia não seria compreensível, como ressaltou Dobzhanski.

Quando dizemos que vacinas salvam vidas, que a evolução explica a tolerância de bactérias a antibióticos e que o Ártico esta derretendo (veja aqui e aqui), isto faz muita diferença: especialmente se há conjuntos de dados empíricos estudados racionalmente, seguindo a lógica que permite traçar um histórico e uma relação causal. Afinal, a sociedade contemporânea aprendeu muito com este modo de pensar, e por isto faz diferença.

Pessoas que negam o valor da vacinação para a saúde pública podem estar minando não só a identidade de seu grupo individualista que pertence, mas a sociedade toda, expondo-a a uma situação perigosa: epidêmica e os dados que veremos atestam isto.

Os Anti-vaxxers

Quem dera deixássemos a seleção natural atuar punindo somente os anti-vaxxers, entretanto, estes poderiam ser convencidos pelo uso da ciência e da razão da importante necessidade da vacinação e que a história da humanidade mostra como pestes atuaram dizimando povos antes do Zé-gotinha existir.

Infelizmente, o movimento anti-vacinação tem se mantido vigoroso desde quando a revista The Lancelot publicou em 1998 um estudo associando a vacinação ao autismo. A revista British Medical Journal (BMJ), onde o estudo foi publicado por Andrew Wakefield, se retratou formalmente, em fevereiro de 2010, e decidiu retirar o artigo de circulação, pois foi responsável pela queda da tríplice vacinação na Grã-Bretanha que sofre os efeitos até hoje. A revista renegou o artigo porque entendeu que se tratava de uma falsificação elaborada pelo autor. Wakefield não pode mais praticar medicina na Grã-Bretanha sob acusação de usar métodos que ferem princípios éticos. Em seu artigo Andrew Wakefield alegou que 12 crianças eram normais até receberem a vacina tríplice viral e se tornarem autistas depois de desenvolverem inflamações intestinais. Mas, segundo a reportagem da própria revista BMJ, feita pelo jornalista Brian Deer, cinco das 12 crianças já tinham problemas de desenvolvimento, fato encoberto por Wakefield.

Mas a falsa notícia fez um estrago que se propaga até hoje, com muitos artistas e celebridades que acabaram abraçando ingenuamente a ideia, como por exemplo: Oprah Winfrey, Jim Carey, Jenny McCarthy, Charlie Sheen e Rob Schneider. Todas estas, são celebridades da California, exatamente onde houve os maiores surtos de doenças evitáveis nos EUA. Muitas dessas decisões foram reforçadas por desdobramentos cada vez mais anti-científicos e pseudo-científicos. Muitos deles reforçados pelo conspiracionismo de controle de massas, indústria farmacêutica etc e tal. Muitos pais deixaram de vacinar seus filhos contra as infecções infantis, contribuindo para um aumento de casos de sarampo nos Estados Unidos e em alguns países europeus, segundo os serviços americanos de controle e prevenção de doenças. Em 2008, tanto o País de Gales e a Inglaterra registraram epidemias de rubeóla.

Um novo estudo científico descartou definitivamente a existência de vínculos entre o autismo e a vacina contra sarampo, caxumba e rubéola (MMR), mesmo entre crianças de alto risco – de acordo com a pesquisa norte-americana Journal of the American Medical Association que realizou o estudo em 95.727 crianças. Neste estudo tinham irmãos mais velhos que tinham autismo e outras, não. Uma vez que o autismo pode ocorrer em famílias, os pesquisadores decidiram verificar se as vacinas poderiam tornar o autismo ainda mais provável em crianças que tinham irmãos com autismo. Eles descobriram que as vacinas não tinham influência no risco de se desenvolver autismo, com ou sem um irmão na família diagnosticado com o problema.

A revista Super Interessante (2015) abordou o tema antivaxxers e apresentou os dados e decisões tomadas por diversos países. Ela destacou, por exemplo, eu em junho daquele ano a Espanha tinha notificado seu primeiro caso de difteria em 28 anos em um menino de 6 anos. Em 2013 o EUA passou pela maior epidemia de coqueluche dos últimos 57 anos com 48 mil infectados. Em janeiro de 2015 a Disney foi foco de um surto de sarampo. Entre o dia 1 e 28 de janeiro de 2015, os Centros de Controle e Prevenção de Doenças registraram 84 casos de sarampo iniciais em 14 Estados americanis. De acordo com informações posteriores, esse número chegou a 146 no fim do mês (The Washington Post, 2016).

O medo da vacinação causada por este falso estudo de Wakefield e por simpatizantes militantes da causa tem gerado prejuízos sociais imensos em diversos países. Como destacou a revista, no Reino Unido e Irlanda a taxa de cobertura da tríplice viral (contra sarampo, rubéola e caxumba) chegava a 92% da população no ano de 1996. Em 2002, ela chegou a 84% e somente em Londres, ela caiu para 61%. Como consequência, houve aumento de casos de sarampo e caxumba, e claro, muitos óbitos. No Reino Unido a primeira vítima fatal foi um garoto de 13 anos em 14 anos.

Algumas das ecolas mais ricas de Los Angeles apresentaram uma taxa de vacinação de 30% – uma taxa muito menor do que a de países como Chade, Sudão onde o acesso avacina é difícil. O preço por ser anti-ciência e apoiar celebridades que se sentem superiores a capacidade de contrair doenças custa cara socialmente. As vezes, mesmo as celebridades que tomamos como referência, defendem posturas abomináveis porque tem influência sob uma grande parcela da população, mas são ignorantes em ciência e irresponsáveis do ponto de vista social.

As reações adversas de vacinas são raras, mas ocorrem e esta dentro de um espectro previsto pelos cientistas, gerando efeitos que são leves. Há registros de casos graves que se sucederam após vacinação, mas que não demonstram relação causa-efeito. Os sintomas adversos são geralmente, febre, fraqueza, falta de apetite, dor no local da picada. A vacina atua a partir de vírus atenuados ou mortos, gerando uma resposta imunológica e tornando o individuo protegido. Quando o vírus invadir esta pessoa haverá um exército de células do sistema imunológico, previamente configuradas especialmente para ataca-lo antes que sua virulência seja expressa. Os anticorpos estarão previamente preparados para os antígenos.

Outro efeito adverso é quando o vacinado desenvolve a doença cuja vacina deveria proteger.  Isto eventualmente corre com a vacina contra a poliomelite conhecida como VOP ou Sabin (a famosa “gotinha”). Entretanto, mesmo este caso é raro, acometendo somente 1 entre 2,7 milhões de pessoas (estatisticamente, é mais fácil ser atingido por um raio 3 vezes).

Em Washington um garoto recém-nascido recebeu a VOP em 1990 e desenvolveu a doença, apresentando paralisia. Com isto, a VOP foi substituída pela VIP (ou seja, a Salk injetável) que apresenta vírus mortos, e não mais atenuados como era na VOP.  Desde 2002 o Brasil adotou o sistema VIP-VOP e vem interrompendo a VOP de modo seguro.

Outro caso que causou polêmica foi da campanha em 2014 contra o HPV onde meninas de 11 a 13 anos seriam vacinadas e os efeitos adversos esperados eram dor de cabeça, enjoo fraqueza e mal-estar. Entretanto, duas meninas de Caxias do Sul (RS) tiveram convulsões cerca de 1 hora após a vacinação. Estas reações não haviam sido registradas na literatura científica e mesmo com todos estes efeitos, as meninas melhoraram e não tiveram problemas neurológicos ou sequelas.

Ainda sim, a vaciação vem sendo questionada. O governo japonês, por exemplo, abandonou o programa de vacinação após problemas no sistema. Segundo Daniel Becker, mestre em saúde pública e pediatria da UFRJ o programa japonês foi suspenso alegando suspeitas entre a relação de vacinas e sídromes como a de Guillain-Barré (doença neurológica), uveítes (inflamação na parte externa do olho), convulsões e encefalites embora nenhuma relação causa-efeito tenha sido estabelecida formalmente pela ciência. Isto significa que não há comprovado a relação entre a administração da vacina e o desenvolvimento destas doenças, e que o programa foi suspenso sem qualquer verificação científica sólida de correlação.

Há também casos que complicam a avaliação das vacinas e que só servem para alimentar a postura anti-vacinação. Este é o caso da vacina Gardasil (contra HPV) e o frânces Bernard Dalbergue que trabalhou 20 anos no Meck Sharp & Dohme e afirmou que tal vacina seria um fiasco na proteção contra o câncer de colo de útero e que a indústria farmacêutica é um poço de corrupção. O problema é que suas alegações podem ser tendenciosas uma vez que ele as fez depois de ser demitido do laboratório por conflitos pessoais após a fusão da empresa. As elegações só serviram para alimentar posturas anti-científicas e conspiratórias. De fato, a maior parte das informações sobre este assunto é encontrada somente em sites conspiracionistas (especialmente sobre Nova Ordem Mundial) onde não há fontes confiáveis e podem simplesmente remeter a teoria de conspiração favorita dos autores.

Outra polêmica veio com o timerosal, uma substância usada como conservante de vacinas e contém mercúrio, que pode causar danos nosistema nervoso. Entretanto, a quantidade dele presente nas vacinas é extremamente pequena, mas neurologistas disseram que poderia fazer mal ao desenvolvimento do sistema nervoso. Assim, países como os EUA, Canadá e suspenderam e baniram o timerosal, retirando-o das vacinas.

Sndo assim, os únicos riscos que as vacinas podem causar são as reações adversas. Por exemplo: a vacina BCG (tuberculose) afeta de 0,4 a 0,9 pessoas por milhão de vacinados: onde o contágio vacinal do bacilo pode ser feito pela pele, ossos ou sistema nervoso. Mas a não-vacinação causa tuberculose com sequelas permanentes no sistema nervoso, afetando a capacidade respiratória levando o indivíduo a morte.

Para a vacina da Hepatite B o efeito adverso afeta 1 pessoa a cada 160 mil habitantes e causa alergia (anafilaxia). Caso a pessoa não tome a vacina pode contrair a doença crônica, evoluindo para cirrose, câncer hepático e pode levar a morte.

A vacina pentavalente DTP + Hib + HB é uma das vacinas mais reatônicas do calendário e pode causar convulsão em 1 a cada 5 mil casos e reação alérgica grave em 1 a cada 110 mil habitantes. Entretanto, caso a pessoa não queira ser vacinada corre o risco de contrair o tétano, coqueluche ou difteria. Os efeitos são mudez e insulficiência cardíaca se contrair difeteria; convulões violentas, embolia pulmonar se contrair tétano; e hemorragia cerebral e desnutrição caso contraia coqueluche.

A vacina Sabin (ou VOP) pode desenvolver a pólio em 1 a cada 2,7 milhôes de habitantes, mas caso a vacina não seja administrada, o paciente pode ter paralisia e morrer. A vacina SCRV (tetra viral) tem como efeito colateral a meningite (inflamação das meninges que recobrem o cérebro) em 1 pessoa a cada 1,8 milhão de pacientes e encefalite em 1 a cada 2,5 milhões de habitantes. Caso não seja administrada, o paciente pode contrair sarampo, caxumba, rubéola ou varicela. Apesar de serem infecções virais brandas, podem em alguns casos levar o indivíduo a morte. Um surto de pólio em Nova York em 1916 deixou cerca de 27 mil pessoas infectadas e mais de 6 mil mortos. A doença está agora retornando em países como o Afeganistão e Paquistão por causa das baixas taxas de imunização. Em um surto de rubéola 1964-1965 é comparado com o que está acontecendo hoje com Zika, levou a mais de mil abortos ou tiveram que ser abortados, e outros 20 mil nasceram com má formação devido a rubéola. A vacina contra a rubéola é agora uma das vacinas-padrão da infância (Washington Post, 2016).

A vacina da Febre amarela pode causar convulsão em 1 pessoa a cada 22 milhões de habitantes e causa hemorragia em 1 a cada 450 mil. Caso não seja administrada, o paciente pode ter hemorragia até a morte.

Pais que optam por não vacinar seus velhos não estão fazendo escolhas em particular, individuais, eles estão tomando uma escolha que afeta toda a comunidade. Tive um experiência na internet certa vez com um vereador/médico de uma cidade que estava fazendo apologia a não-vacinação. Aapesar de sua formação, em medicina, sua apologia feita em redes sociais era respaldada não por artigos científicos, mas por links de vídeo no youtube e sites conspiracionistas cujas informações não eram formais. Este tipo de postura é anti-ética frente a sua formação em medicina (por isto denunciei-o ao Conselho de Medicina com um print da página), mas também afeta o próximo, porque o indivíduo pode deixar de vacinar seus filhos por motivações pessoais. Porém, não é cabível induzir pais de outras crianças a não vacina-los (usando sua formação de medicina como autoridade) por uma posição pessoal, nada profissional e cientificamente informal. De fato, se uma criança deixa de ser vacina e morre vítima de uma doença, certamente o médico que fez apologia de não-uso da vacina não se responsabilizará, e a culpa recairá sobre o pai da criança que é quem decide em última instância se vacinará seu filho, ou não. Neste sentido, a atuação do médico perpetuará arrebanhando mais pessoas que pouco dominam o assunto.

Quando recebemos a vacina, isto faz com que haja diminuição da circulação de agentes infecciosos na comunidade. Quando se diminui o número de pessoas susceptíveis, diminui-se a chance de transmissão. As pessoas vacinadas beneficiam o grupo inteiro, inclusive aqueles que não tomaram a vacina. Mas para que haja sucesso, cada doença tem uma porcentagem de pessoas que precisa ser vacinada. Por exemplo, para a catapora e difteria a taxa de imunidade precisa ser pelo menos 80% da população. Para a coqueluche e sarampo a taxa deve ser entre 92 e 95%. Quanto maior a taxa de imunização maior o controle, pois adultos tem maior resposta imunológica. O problema é que nem todas as pessoas de uma população podem ser imunizadas. Mulheres grávidas, crianças com imunodeficiência, pessoas com câncer ou alérgicas e outros grupos menores não podem ser vacinados. E claro, eles dependem diretamente da imunidade do resto da população para permanecerem vivos e saudáveis. Para estes grupos não é uma questão de escolha, eles dependem diretamente dos imunizados. Quando uma pessoa deixa de tomar vacina porque foi induzida por falsos argumentos e é questionada sobre tal postura comete um ato egoísta de pensar somente em sua crença, desconsiderando a saúde de seus filhos e de tantos outros grupos sociais que dependem da imunização de todo o rebanho.

Quando este tipo de postura é tomara certos governos interferem em uma decisão que parece ser pessoal e tornam a vacinação obrigatória. Na Austrália, o governo corta benefícios de quem deixa de vacinar os filhos. A Califórnia aprovou uma lei que proíbe a não-vacinação dos filhos. No Brasil, quem não atende o calendário básico de vacinação obrigatório por lei corre o risco de se multado e pessoa pode ser apreendida e levada para a vacinação obrigatória.

As vacinas já erradicaram doenças muito perigosas, como a varíola na década de 1980 e a póliomelite na América e Europa na década de 1990. Além disto, conseguimos controlar o tétano, sarampo e atuberculose no Brasil Não há motivo algum para presumir que a vacinação seja algo ruim quando observamos o histórico de seus resultados.

Sabemos então que a vacinação não causa autismo, e que tal especulação já foi desbancada pela comunidade médica atualmente. A ciência também tem plena noção de que vacinas não proporcionam 100% de proteção. Esta ideia ainda é bastante defendida quando se discuti o assunto. O potencial de proteção de vacinas chega a 95% de efetividade. Outra falácia é a de que as crianças recebem mais vacinas do que seu sistema imunológico pode suportar. Sabe-se que o sistema imunológico pode responder cerca de 100 bilhões de antígenos ao mesmo tempo e a vacina tríplice viral contém somente 24 antígenos. Logicamente, é igualmente falso que vacinas enfraquecem o sistema imunológico. Pelo contrário, elas o fortalecem garantindo a sobrevivência.

Outra alegação falsa dos antivaxxers é que a maioria das doenças evitáveis por meio da vacinação estão sumindo e portanto, vacinar não é mais necessário. Os surtos da California e tantos outros que destacamos aqui dizem o contrário. O fato é que determinados grupos de doenças sempre vão exigir níveis altos de vacinação, como o sarampo (95%) para não se propagar. Alguns grupos ainda defendem que a imunização pela contração da doença é melhor. Apesar da imunização produzida pela contração da doença ser mais forte, assume-se um grande risco em contrair doenças não atenuadas que podem ter altos índices de virulência, e as chances de morte são maiores.

Uma pesquisa publicada em 2016 na American Academy of Pediatrics (AAP) mostra que mais e pais e mães estão se recusando a vacinar seus filhos. Grande parte do problema é por causa de reivindicações feitas por famosos, especialmente pelo ator Jim Carrey e o candidato presidencial republicano Donald Trump, seguindo a velha falácia da ligação entre vacinas e autismo (Washington Post, 2016).

O estudo da AAP envolve uma amostragem aleatória de cerca de 630 membros em 2006 e novamente em 2013. Eles descobriram que, em 2006, 75% dos pediatras responderam que tinham encontrado pais que se recusaram a vacinar seus filhos. Em 2013, o número chegava até 87%. Isso é uma grande mudança, mas a parte mais interessante da pesquisa é o porque. Em 2006, a motivação para a não-vacinação de seus filhos era por causa de preocupações com o timerosal e o autismo. Em 2006, 74% disseram que era sobre o autismo e em 2013, esse número caiu para 64%.

Agora, os pais estão se recusando a vacinar seus filhos por que argumentam que isto é “desnecessário”. Cerca de 73,1% em 2013 contra 63,4% em 2006. Além disso, até mesmo os pais que acreditam em vacinas parecem estar atrasando as vacinas alegando que seria preciso um cronograma de vacinação mais rigoroso para maximizar a sua eficácia. Setenta e cinco por cento dos pediatras disseram que os pais argumentaram atrasos na vacinação por causa de preocupações com “desconforto” do seu filho e 72,5% por causa de uma preocupação com uma sobrecarga no sistema imunológico.

A velocidade rápida na qual um surto moderno pode se propagar foi demonstrada no caso do sarampo na Disneylândia. Não houve mortes, mas muitos casos foram muito graves.

Uma boa parte da recente controvérsia sobre vacinas concentrou-se em uma nova vacina para o HPV, ou vírus do papiloma humano, para pré-adolescentes ou adolescentes. A adoção desta vacina tem sido baixa, em parte porque os pais e pediatras podem estar relutantes em discutir o fato de que ele protege contra um vírus sexualmente transmissível.

A publicação do paper da AAP coincidentemente veio no mesmo momento de um surto de caxumba nos Estados Unidos. Nos últimos meses, pelo menos 36 pessoas contraíram caxumba somente em Long Island, causando inchaço nas faces e sintomas respiratórios.

A AAP expressa uma grande preocupação sobre as conclusões do estudo, afirmando que o não cumprimento do calendário recomendado pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças é um problema crescente de saúde pública.

Se a insistência da AAP em persuadi-los da importância da vacinação não funcionar, o risco de epidemias é altamente provável.

A pesquisa pediatrica também mostrou que mais médicos estão rejeitando atender pais que se recusam a vacinar seus filhos. Em 2006, apenas 6,1% disseram que “sempre” descartam pacientes para isso. Em 2014, 11,7% disseram que sempre dispensam pacientes que não vacinaram os filhos. Então, se você continuar a recusar as vacinas, é seu direito – mas pode ser mais difícil de encontrar um pediatra dispostos a apoiar essa escolha, ao menos nos EUA (Washington Post, 2016).

Victor Rossetti

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